Oi! Se você segue a página do Books, brownies and beyond no Facebook, já sabe que eu havia prometido uma série sobre intercâmbio aqui no blog!
Estudar fora é um grande sonho pra muita gente, mas diversas vezes desistimos por achar que é algo muito difícil, muito caro, muito inacessível. Esta série é pra te convencer de que, sim, é possível fazer um intercâmbio ou mesmo um mestrado fora do Brasil. Claro que isso exige preparo, dedicação e um pouquinho de aperto financeiro, mas com certeza vale a pena!
Para dar uma forcinha no seu sonho (e meu também!), eu pedi a três amigos meus que estão estudando fora do Brasil que contassem um pouco sobre como é a experiência de estudar na Alemanha, na França e na Inglaterra!
Eu admito que fiquei super curiosa pra saber o que eles iam dizer e aproveitei pra perguntar coisas que eu sempre quis saber, mas nunca tinha perguntado. Pra facilitar, dividi as informações em três etapas: Perfil, Acadêmico e Cultural.
Hoje, com muita alegria eu compartilho aqui as resposta do Thales Moraes, meu grande amigo =) , que está estudando na França. Nós estudamos Relações Internacionais juntos na UFRJ e eu juro, ele era a pessoa mais popular, querida e genial da minha turma!
Espero que vocês gostem e matem a curiosidade. E, claro, deixem muitas dúvidas e perguntas nos comentários. Vamos adorar respondê-las!
Fique de olho que nas próximas semanas também teremos os posts sobre a Alemanha e a Inglaterra.
Um beijo!
Laís
***Estudando na França***
Perfil
Nome: Thales Moraes da Silva
Idade: 23
País e cidade onde está morando: Paris, França.
Universidade onde você está estudando: Instituto de Estudos Políticos de Paris (SciencesPo)
O nome do seu curso: Ciência Política – Relações Internacionais
Marque uma das opções abaixo:
[ ]intercâmbio da graduação [ x ]mestrado
Acadêmico
Você sempre quis estudar fora do Brasil?
R.: Sim, desde jovem eu tinha vontade de estudar fora. Em 2011, aos 19 anos, durante a graduação, fiz um semestre de intercâmbio na Universidade de Nantes, na França. A experiência me deixou com mais vontade ainda de voltar ao país para passar um período mais longo. Dentre outros motivos, foi por isso que, ao terminar a faculdade no Rio, enviei uma candidatura de mestrado para cá.
Qual foi a maior diferença que você notou entre estudar no Brasil e estudar no país onde está agora? Quais foram as maiores dificuldades?
R.: Não saberia dizer qual foi A maior diferença, mas posso mencionar algumas. Em primeiro lugar, a dinâmica das aulas. Na França, as aulas começam e terminam quase sempre pontualmente. Os alunos também devem ser pontuais. Atrasos são muito mal vistos. Aliás, na SciencesPo, no sistema de controle de presença que o professor acessa pelo computador, há as opções “presente”, “ausente” e “atrasado”. Outro aspecto curioso é que os alunos não saem de sala durante a aula, e estas geralmente duram 2 horas. Além disso, é costume os alunos levarem seus notebooks para o curso e digitarem tudo o que o professor fala. É como se eles fizessem uma transcrição da fala do professor.
Em segundo lugar, a relação entre alunos e professores. Comparada com o que temos no Brasil, a relação aqui é bem mais hierarquizada e formal. Os alunos não podem, por exemplo, chamar o professor de “você” (tu), apenas de “senhor” (vous). Em geral, está fora de cogitação adicionar professor no Facebook, ir à casa do professor, ir ao bar com um professor, ou seja, estabelecer uma relação de proximidade ou amizade fora da universidade.
Em terceiro lugar, o método de trabalho. Na França, trabalhos escritos e apresentações orais são bem mais “enquadrados” do que no Brasil. É preciso seguir planos bem determinados e estruturados (introdução, 2 ou 3 partes, 2 ou 3 subpartes, conclusão...). Parece-me herança de uma tradição cartesiana. E isso impõe certas dificuldades. Sinto falta da flexibilidade e da liberdade que tinha nas apresentações e nos trabalhos no Brasil.
Outra curiosidade: segundo o sistema de notação francês, é extremamente raro que um aluno obtenha a nota máxima. Na França, a nota vai de 0 a 20 (e não de o a 10, como no Brasil). Pelo que vi, as notas geralmente ficam entre 10 e 15. Tirar 16 já é algo muito bom! Lembro-me de uma vez em que, numa aula de francês para estrangeiros, após fazer vários elogios à apresentação de um aluno austríaco, a professora lhe deu nota 14. O aluno perguntou à professora porque a nota era 14 se ela disse que o trabalho estava muito bom. A professora respondeu que 14 já era uma nota muito boa!
Por fim, saliento que, em relação à formação intelectual, considero que os cursos que fiz no Brasil (Ciências Sociais na UERJ e Relações Internacionais na UFRJ) foram tão bons quanto os cursos que fiz aqui na França, tanto no que concerne às leituras quanto à qualidade dos professores. A vantagem aqui na França é uma melhor estrutura física da universidade, com excelentes instalações e bibliotecas.
O pessoal na universidade foi receptivo?
R.: Já tinha feito intercâmbio na França em 2011 (um semestre em Nantes), e praticamente não consegui estabelecer contato com os “nativos” na faculdade. Lembro-me de ter ficado desapontado com a falta de interesse dos franceses em relação aos estudantes estrangeiros. Tirando algumas raríssimas exceções, eles não falavam conosco, não nos perguntavam nada, nem nos ofereciam ajuda. Talvez um dos motivos para essa falta de integração tenha sido o fato de eu ter feito matérias com várias turmas diferentes, de modo que eu só encontrava os mesmos grupos de pessoas uma ou duas vezes por semana.
Dessa vez, para minha grata surpresa, o pessoal foi bastante receptivo. Estou numa turma de mestrado de 21 alunos, 7 dos quais estrangeiros. Por fazermos todas as matérias juntos, nos vemos diariamente, o que certamente ajuda na criação de laços. Além disso, a maioria dos franceses já fez intercâmbio, tendo passado pela experiência de estar na nossa pele.
Lembro-me que no primeiro dia de aula, após uma reunião com os professores do curso, uma francesa e um francês vieram falar comigo e perguntar de onde eu era. Fiquei feliz com aquela demonstração de curiosidade. Em seguida, outro francês sugeriu que fossemos para um café (programa bem parisiense!). Com o passar do tempo, a interação se intensificou e a minha boa impressão inicial foi se confirmando. Hoje, após 4 meses de aula, sinto-me bastante integrado, fazendo parte inclusive de um grupo de colegas composto por 5 franceses. Duas colegas me passaram suas anotações do curso para eu poder estudar (já que não consigo anotar tudo o que professor diz em aula), nos reunimos na casa uns dos outros, vamos ao cinema juntos, à biblioteca, enfim, ampliamos a relação para além dos muros da universidade.
O que as pessoas daí acham do Brasil?
R.: O Brasil está muito presente no imaginário francês, talvez tanto quanto a França (sobretudo Paris) esteja presente no imaginário brasileiro. Os franceses têm uma imagem muito positiva do Brasil, e várias vezes já me aconteceu de franceses me perguntarem de onde eu era e, após eu dizer que vinha do Brasil, eles sorrirem. Isso aconteceu inclusive com uma policial que me parou e pediu meus documentos no aeroporto. Quando entreguei meu passaporte, ela o olhou e me disse: “Ah, você é brasileiro?”, e abriu um sorriso! Quando digo então que sou do Rio, a reação geralmente é um suspiro apaixonado seguido de um “Que legal!”, “Que máximo!”...
Isso não significa que os franceses em geral conheçam bem o Brasil. Sabe aquele negócio de acharem que falamos espanhol? Já presenciei algumas vezes! O que está presente em seu imaginário são os estereótipos de um país com natureza exuberante, com belas mulheres, bom no futebol, com um povo alegre, simpático e que sabe fazer festa! De todo modo, tais clichês compõem uma imagem positiva de nós.
Quais são as dicas que você dá para os brasileiros que querem estudar fora do Brasil?
R.: Informar-se bastante a respeito da faculdade e dos cursos, e também se informar bastante sobre o país e sobre a cidade. Ler relatos de outros estudantes e conversar com eles é bastante útil. Há blogs e páginas no Facebook onde as pessoas compartilham suas experiências. Isso pode fornecer uma prévia do que encontraremos no exterior. Ademais, não hesitar em ativar sua rede de contatos, falando com conhecidos, amigos, amigos de amigos e por aí vai para conseguir ajudas e esclarecimentos!
Cultural
Como foi o processo de mudança?
R.: Meu processo de mudança começou com toda a papelada administrativa para obtenção do visto. Ao mesmo tempo, minha grande preocupação era encontrar um alojamento, se possível não exorbitantemente caro, e, no melhor dos casos, bem localizado. Entrei em contato com amigos franceses do Brasil e da França para ver se eles conheciam alguém em Paris disposto a me alugar um quarto. Como fiquei com uma família em Nantes, pensei em repetir a experiência em Paris. Entretanto, a única possibilidade mais concreta de que tive notícia (uma amiga de uma amiga que alugava o quarto do filho, pois este tinha se mudado da França), desmanchou-se quando a pessoa me avisou que a ocupante atual do quarto tinha decidido prolongar sua estadia. O tempo passava e a preocupação aumentava. Faltando pouco mais de 1 mês para a mudança, recebi um e-mail da minha universidade dizendo que eles poderiam reservar um quarto para mim na Cidade Internacional Universitária de Paris. Fiquei bastante aliviado! Além disso, a Cidade Universitária de Paris é um lugar absolutamente fantástico! Tive bastante sorte! É sempre válido conferir se a universidade consegue reservar alojamento para os estudantes estrangeiros. Isso é uma mão na roda!
Em seguida, comecei a pensar no que eu levaria, afinal de contas, seria uma viagem de 2 anos. Trouxe muitas roupas, mas não esvaziei meu guarda roupa. Uma das minhas grandes lamentações foi o fato de não poder trazer meus livros (só trouxe 10). Viajei com uma mala grande, uma média e uma pequena, além da mochila.
Cheguei a Paris dia 15 de agosto, mas no mesmo dia peguei um trem para encontrar minha “família francesa” no Oeste e passar uns 12 dias com eles. Antes, porém, deixei minha grande mala na casa da amiga de uma amiga em Paris, para não ter que viajar de trem com 3 malas e uma mochila. Ter passado os primeiros dias com pessoas conhecidas e queridas foi muito importante para facilitar minha transição. Só voltei para Paris no dia 28, ficando ainda alguns dias na casa daquela amiga da minha amiga onde deixei a minha mala. Isto porque meu alojamento só estaria disponível a partir de 1º de setembro. Nesta data, finalmente, instalei-me no meu quarto, e nesse mesmo dia comecei a faculdade. Os dias que se seguiram foram bem intensos, pois tive que resolver muitas coisas práticas, como abrir conta em banco, enviar documentos para o escritório de imigração, comprar um chip de celular, fazer a carta de transporte, fazer um plano de saúde estudantil, comprar utensílios para o quarto (panelas, pratos, talheres, além de comida, claro!) etc. Isso sem contar a ambientação na nova universidade, as aulas e os textos que eu já tinha para ler! É um período também em que todo dia conhecemos gente nova! Enfim, o começo do intercâmbio geralmente é bem agitado! É preciso manter a calma e ir resolvendo o que tiver que se resolvido! Com o passar do tempo, e o tempo passa depressa!, as coisas começam a entrar nos seus eixos!
Quais são as diferenças culturais mais marcantes entre o Brasil e o país onde você está?
R.: Para mim, as diferenças mais marcantes, sendo muitas vezes sutis, estão nos códigos de sociabilidade. Os franceses em geral são mais fechados e “frios” do que os brasileiros, o que pode nos causar dificuldades não apenas numa primeira aproximação como também na manutenção da relação. Não é comum as pessoas puxarem papo no metrô, dentro do ônibus, em filas de espera... Cumprimentos que envolvam contato físico, como beijos e abraços, também são menos comuns do que no Brasil. Mas, uma vez que você consegue estabelecer certo grau de relação, eles são realmente “amigos”, no sentido de te ajudar e se preocupar com você. Gostam de nos receber em suas casas e passar momentos juntos. Aliás, tenho muitos amigos franceses que conhecem o Brasil por já terem estudado ou trabalhado lá, e quase todos dizem que é muito fácil estabelecer um contato inicial com os brasileiros, mas que é muito difícil criar verdadeiros laços de amizade. Segundo eles, as relações no Brasil são “superficiais”. O que acho mais interessante de tudo isso é que, de fato, os significados de “amizade” e “amigo”, bem como as relações que isso pressupõe, não são os mesmos no Brasil e na França. É preciso estar aberto a essas diferenças culturais e não esperar que os franceses ajam e se comportem como os brasileiros.
Paralelamente a isso, os franceses são muito polidos, utilizando sempre palavras e expressões como “bom dia”, “por favor”, “perdão”, “com licença”, “desculpe-me”, “tenha uma boa noite” etc. É preciso também estar atento a certas formalidades, uma vez que não podemos tratar por “você” professores, atendentes de lojas, garçons e pessoas que não conhecemos em geral.
Qual o feriado/festa nacional mais divertido/interessante no país onde você está?
R.: Em junho, durante o verão, ocorre a “Fête de la Musique”, evento cultural no qual vários artistas e grupos amadores se apresentam em palcos espalhados pelas ruas e praças da cidade. Descobri esse evento em 2011, quando estava em Nantes, e achei bem interessante. Já este ano conheci a “Journée du Patrimoine”, que é um fim de semana de setembro no qual milhares de lugares privados e públicos são abertos à visitação, de museus até embaixadas e prédios oficiais. Aproveitei para fazer o chamado “Circuito do Poder”, conhecendo o palácio do Ministério das Relações Exteriores, a Assembleia Nacional, o escritório do Primeiro-Ministro (Matignon), além de outros prédios ministeriais. Mas confesso que um dos eventos que mais aguardo para conferir aqui em Paris é o 14 de julho (Festa nacional), quando se comemora a tomada da Bastilha e há uma belíssima queima de fogos na Torre Eiffel!
Como é o custo de vida no país?
R.: O custo de vida na França varia bastante entre Paris e as demais cidades. Em Paris, o mais caro é o preço dos alugueis/alojamentos. Pequenos quartos ou estúdios de uns 10 ou 15m² podem facilmente custar em torno de 500 euros mensais! Comer fora, em restaurantes, também não costuma ser barato. Do resto, não considero que o custo de vida em Paris seja mais caro do que o custo de vida no Rio. Em relação ao transporte, por exemplo, é possível gastar menos aqui do que no Rio, pois existem cartas de transporte mensais com desconto para jovens e estudantes (36 euros por mês). Aliás, é possível ter uma ajuda do governo para o aluguel também. Essa ajuda pode chegar a mais de 100 euros por mês. Já nas outras cidades da França, como Nantes, Bordeaux, Toulouse, Lyon, Lille, o custo de vida é consideravelmente menor do que em Paris, sobretudo em função do alojamento. Conseguir uma vaga numa Cidade Universitária ou num alojamento estudantil diminui as despesas. Embora Paris seja fantástica, aconselho igualmente as outras cidades francesas, sobretudo para quem não tem bolsa e/ou tem um orçamento apertado.
Onde você está morando? Aluguel, alojamento, residência estudantil etc.?
R.: Na Cidade Internacional Universitária de Paris.
Quais os lugares que você mais gosta de visitar aí?
R.: Gosto de caminhar à beira do Sena e passear pelo pátio do Louvre e pela Avenida Champs Elysées. Gosto muito de ir a museus também, e aqui na França, sendo estudante com menos de 26 anos, a entrada em vários museus é gratuita. Mas meu passeio preferido em Paris é ir ver e admirar a Torre Eiffel!
O que você mais gosta de comer aí?
R.: Antes de vir para a França, temia que não fosse gostar da comida francesa. Grande engano! A comida aqui é maravilhosa, sobretudo as massas, os pães, os doces e os croissants. No geral, acho que os franceses possuem uma alimentação bem diversificada e equilibrada. Quando morava com uma família francesa em Nantes, havia geralmente um prato de entrada, um prato principal, a rodada de queijos e a sobremesa. Essa fórmula de “entrada + prato principal + sobremesa” também existe nos restaurantes universitários, onde, aliás, é possível comer bem pagando pouco (3 euros). Enfim, gosto de comer pães, queijos (meu preferido é o Comté!), iogurte de frutas, dentre várias outras coisas!
Como você se locomove até a universidade ou outros lugares?
R.: Costumo ir à universidade de metrô, embora prefira ir de ônibus para admirar a paisagem. Gosto bastante de ir aos lugares a pé também. Caminhar por Paris é bem agradável! Em Nantes, por ser uma cidade menor, fazia praticamente tudo de bicicleta (ir à faculdade, ir fazer compras, ir a festas...). É possível se locomover de bicicleta aqui também.
Você pensa em ficar de vez no país onde está estudando? Por que?
R.: Não diria “ficar de vez”, mas talvez queira ficar mais do que os 2 anos que normalmente passarei aqui. O principal motivo é que a qualidade de vida que tenho em Paris é bem superior à qualidade de vida que tenho no eixo Rio-Niterói. Sinto-me mais seguro aqui e gosto bastante da organização da cidade (para muitos franceses, principalmente para os franceses de outras cidades, Paris é meio caótica, com muita gente, muito barulho, muito trânsito... Isso é relativo! Para quem vem da caótica Cidade Maravilhosa, a Cidade Luz é um exemplo de organização!). O sistema de transporte (com metrôs, ônibus, bondes e bicicletas), por exemplo, é excelente comparado ao que temos no Rio.
Qual é a parte mais legal da experiência de estudar fora?
R.: Creio que o mais importante de morar fora do país é descobrir e aprender que existem outras culturas, outras formas de ver o mundo e outras maneiras de se viver. Gosto muito do convívio com os franceses e com os outros estrangeiros, pois aprendo muito com eles, seja conversando, seja observando seus gestos e comportamentos. No aspecto estritamente acadêmico, considero um desafio enriquecedor estudar num idioma estrangeiro.
Tem alguma dúvida ou informação pra compatilhar? Deixe nos comentários!